Divagações: Howl

Um filme não precisa seguir um formato tradicional para contar sua história. Ainda que ele possa acabar afastando uma parte do público (ao...

Um filme não precisa seguir um formato tradicional para contar sua história. Ainda que ele possa acabar afastando uma parte do público (ao menos pelo raciocínio simplista de muitos produtores), esse tipo de longa-metragem também promove uma maior reflexão e ajuda na evolução narrativa da linguagem cinematográfica. E nada mais adequado para um cenário de experimentações que Howl.

Há várias coisas, não necessariamente simultâneas, sendo alternadas na tela. Uma é a famosa primeira leitura do poema Howl, feita em 1955 por seu autor, Allen Ginsberg (James Franco). Outra é uma animação baseada no próprio poema e em desenhos do poeta. Há também uma versão posterior de Ginsberg, dando uma entrevista sobre sua vida, com eventuais dramatizações de acontecimentos envolvendo Jack Kerouac (Todd Rotondi), Neal Cassady (Jon Prescott), Peter Orlovsky (Aaron Tveit) e outros. Além disso, vários especialistas em literatura comentam suas percepções do poema em um julgamento contra o editor e livreiro Lawrence Ferlinghetti (Andrew Rogers), acusado de vender uma obra obscena.

Com sua construção peculiar, os diretores e roteiristas Rob Epstein e Jeffrey Friedman trouxeram não apenas um filme sobre o julgamento ou sobre o poeta, mas uma produção a respeito o poema em si. Há um tanto de informações sobre o autor e outro sobre a reação na época a partir de diversos setores, além da própria obra, representada na maneira como foi inicialmente apresentada ao mundo e por meio de uma interpretação posterior – embora eu acredite que a leitura ainda seja recomendada.

Howl, a princípio, não dá respostas prontas, mas o fato de estarmos comentando sobre essa obra até hoje dá uma bela noção sobre a sua importância literária. Para aqueles que já a conhecem de forma mais profunda, o longa-metragem talvez tenha pouco o acrescentar, mas bastante coisa pode ser aproveitada quando ainda se considera que há muito o que aprender.

Ainda assim, sinto que falta uma perspectiva importante, que coloque o poeta e seus colegas da geração beatnik dentro de uma perspectiva histórica ampla. Afinal, eles são resultantes de uma sociedade pós-guerra, expressam novas ansiedades e padrões de comportamento e foram responsáveis por muitas mudanças – e não apenas no universo literário. Para entender Howl – o texto e o filme – é preciso levar isso em consideração.

A produção também se beneficiaria de coadjuvantes melhor construídos. Com as possíveis exceções do protagonista (ainda que James Franco não vivesse meu momento mais inspirado) e do advogado de defesa, Jake Ehrlich (Jon Hamm), nenhum outro personagem é exatamente digno de atenção. E olha que estamos lidando com muitas personalidades bem marcantes! Ainda assim, é possível entender e justificar as escolhas dos cineastas com base na história que eles pretendiam contar.

Justamente por não ser um filme tradicional, Howl também não é uma obra recebida facilmente pelo público. Ainda assim, vale a pena deixar de lado o estranhamento inicial e perceber que não se trata, de modo algum, de uma história difícil. Queria eu ter entrado em contato com um filme assim nos meus tempos de Ensino Médio!

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