Divagações: Kimi no na wa

Enquanto os estúdios gastam rios de dinheiro para produzir e promover possíveis blockbusters, há filmes com um grande potencial que passam...

Enquanto os estúdios gastam rios de dinheiro para produzir e promover possíveis blockbusters, há filmes com um grande potencial que passam quase despercebidos. Kimi no na wa é um belo exemplo disso. Essa animação não só foi o filme que mais vendeu ingressos no Japão em 2016, como se tornou o anime com maior bilheteria de todos os tempos, inclusive ultrapassando Sen to Chihiro no kamikakushi. No ocidente, o filme passou por alguns festivais, teve estreia em um punhado de países e foi esnobado pelo Oscar. Mas ainda dá para redescobrir essa animação caprichada e com uma história intrigante.

Mitsuha Miyamizu (Mone Kamishiraishi) é uma adolescente que vive com a avó e sua irmãzinha em uma pequena cidade rural do Japão. Ela sonha em conhecer a cidade grande e vive um momento difícil, pois tem vergonha de participar dos rituais tradicionais e, para completar, seu pai é o prefeito e suas personalidades costumam colidir. Por sua vez, Taki Tachibana (Ryûnosuke Kamiki) é um menino comum de Tóquio, que estuda e trabalha em meio período para bancar seus pequenos luxos. Ele sonha em ser arquiteto e busca por um significado maior.

Sem qualquer explicação aparente, os dois começam a eventualmente trocar de corpos. Um simplesmente acorda no lugar do outro e, à noite, eles voltam para si mesmos, trazendo apenas lembranças difusas do dia em que viveram como outra pessoa. Isso ocorre com alguma frequência, mas sem uma periodicidade determinada, atrapalhando consideravelmente a vida de ambos. Eventualmente, eles estabelecem um sistema para se comunicarem, mas as mensagens ficam difusas com o tempo e eles têm dificuldades de lembrar de coisas simples, como o nome um do outro. A situação, então, encontra um empecilho adicional quando eles decidem efetivamente se encontrarem.

Fiel ao espírito adolescente de seus personagens, Kimi no na wa existe em um universo repleto de pequenas vergonhas e segredos, intercalados por momentos de grande ousadia e determinação. Ao longo de suas jornadas, tanto Mitsuha quanto Taki se transformam, aprendendo com alguém que nunca encontram de verdade. Embora isso pareça ser o mesmo conceito de tantos filmes de ‘trocas de corpos’ que existem por aí, a abordagem é bastante diferente, mais delicada e muito sensível, sem nunca cair na comédia escrachada e evitando a maior parte dos clichês do gênero.

Na verdade, não é difícil entender como é o tom da obra se você já assistiu a qualquer filme do diretor e roteirista Makoto Shinkai. O cineasta é constante em seu estilo, construindo suas histórias mais com expressões, momentos e nuances do que com grandes gestos e diálogos (embora eles existam). Aliás, já me disseram que Shinkai trabalha basicamente sobre o tema da distância, com todas as suas obras explorando o mesmo assunto. Até o momento, não encontrei nenhum filme que contradiga essa informação – e Kimi no na wa, inclusive, é bastante devotado a ela.

Outro aspecto que merece destaque é a beleza da animação e dos cenários. O filme todo é muito caprichado, com movimentos fluídos e um visual que merece ser chamado de poético, onde cada detalhe merece atenção. O contraste entre a cidade e o campo é particularmente bem trabalhado, estando presente no estilo de vida dos personagens, em sua relação com as pessoas que os cercam e, claro, em planos de fundo repletos de elementos diversos.

Kimi no na wa é um filme completo. É um espetáculo visual, é entretenimento de boa qualidade, é intrigante e possui um conteúdo interessante. Não é uma animação para crianças pequenas, mas acredito que qualquer um com maturidade suficiente para compreender a trama deve se apaixonar pelo que vê na tela.

Outras divagações:
Byôsoku 5 senchimêtoru

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